“O sonho encheu a noite. Extravasou pro meu dia. Encheu minha vida e é dele que eu vou viver. Porque sonho não morre” (Adélia Prado)

1 de fev. de 2011

Alguém viu minha memória por aí?


Outro dia recebi um email dizendo que o Aspartame causa o Mal de Alzheimer.
Não dei nenhuma importância, visto a quantidade de emails assustadores que eu recebo diariamente. Eu só começo a dar importância às coisas desse tipo quando aparecem no Fantástico. Deletei o tal email e continuei tomando meu cafezinho com 17 gotas de adoçante (não é uma piada, eu tomo adoçante com café).

Mas o que aconteceu comigo logo depois me levou a lembrar do tal email, desta vez com real preocupação: tive um apagão daqueles! Deu branco, branco total! Inexplicável! Constrangedor!

Pensei muito na minha avó paterna que sofria de Alzheimer e, segundo dizem os médicos, é uma doença genética. Minha avó se esqueceu de tudo, até dela mesma. Vivia fugindo de casa e deu um trabalhão danado! Mas ela tinha noventa anos e eu só tenho cinquenta e unsss...

Voltando ao ocorrido, vou descrever exatamente como aconteceu:

Eu estava no estacionamento do hipermercado quando uma moça morena e sorridente caminhava saltitante em minha direção. Ela carregava sacolas, logo presumi que estava de saída e eu acabara de chegar, ainda descendo do carro. Pelo sorriso largo que ela exibia dava pra notar que ficou feliz em me ver ali. Eu ainda olhei para os lados para me certificar se todo aquele entusiasmo era mesmo comigo. E era. O rosto era familiar, isso percebi logo de inicio, mas quem era ela? De onde nos conhecíamos?

Na medida que ela caminhava em minha direção, fiz um esforço descomunal para tentar me lembrar. Lembrar do nome, então, seria o mesmo que pedir por um milagre!

Ela aproximou-se esfuziante e, beijinho pra cá, beijinho pra lá, nossa intimidade era evidente:
- Nooooossa que bom te encontrar por aqui, já estava com saudade.
- Eu também – menti.

A atitude dela me desarmou completamente: se a gente não faz a pergunta “de onde mesmo que nos conhecemos?” logo no início, não fazemos nunca mais.

- Ainda ontem eu e a Marisa falamos tanto de você...

Deus meu, quem é a Marisa? Mais uma personagem entrava na história para agravar ainda mais a minha angústia.

- É mesmo? – perguntei ao acaso E por falar nela, como ela está? – espertinha eu, agora sim, vinha uma pista...
- Está ótima! – morreu o assunto. Sai de cena a Marisa.

Eu já começava a suar por todos os poros e levar aquela conversa adiante era coisa pra mestre do improviso. Eu iniciava as frases com as palavras: viu... sabe... olha... então..., tudo em substituição do nome dela.

Conversa vai, conversa vem, e a dado momento eu não estava mais ali, minha mente viajava vertiginosamente entre o presente e o passado: talvez ela seja uma antiga aluna de pintura, daquelas que já decorou a casa e sumiu... Não, não pode ser, a costumeira frase “preciso voltar às aulas” nem rolou na conversa... Ou, quem sabe, ela é uma daquelas diaristas extras que eu chamo de vez em quando... Mas com essas unhas impecáveis? Duvido! Quem já faxinou a minha casa fica com as unhas destruídas pro resto da vida!... Além do mais, ela parece gostar de mim...

A situação começava a ficar insustentável. Pra mim, pois ela parecia não notar nada e continuava falando, falando... E eu saindo, saindo... pela tangente.

Na primeira brecha pedi desculpas e disse que estava com um pouco de pressa. Despedimos-nos e ela ainda me disse: “me liga se for mudar de horário”.

HORÁRIO – Essa palavra ficou martelando na minha cabeça.

Como sempre faço, comecei pelo setor de hortifrutigranjeiros, mas não conseguia me concentrar nas compras. Toda vez é assim: quando esqueço algo, a coisa não sai da minha cabeça, perco a paz e penso naquilo dia e noite!

Não posso esquecer do alho... Mudar de horário, que horário?!... Noooooossa como a vagem tá cara, será que tá em extinção?... Seria o horário de alguma consulta médica?... Me recuso a pagar por esses tomates atropelados... Será que ela é a mocinha da recepção de algum consultório médico?... Não tem ovos brancos?Na boa, sem preconceito, mas se a galinha não for branca eu tenho nojo... Será que eu já tô tratando do meu Alzheimer e me esqueci?... Olha o preço desses pimentões, devem estar vermelhos de vergonha... Quando chegar em casa vou olhar na agendinha se tenho consulta marcada com algum psiquiatra... Onde eles colheram essa alface, na lata do lixo?... E se eu esquecer de olhar na agendinha?...

A caminho de casa eu ainda pensava na tal moça. Repassei mentalmente dezenas de vezes a nossa conversa. Talvez eu tivesse perdido algum detalhe.

Talvez ela nem exista... Talvez ela seja apenas uma invenção da minha cabeça, um tipo de personagem imaginário dentro da minha loucura... Talvez não seja Alzheimer, talvez seja esquizofrenia... Talvez eu estivesse mesmo doente. Talvez não. Talvez eu sempre fui assim, eu é que não sei... Dizem que quem não é normal não sabe que não é... Mas eu já perguntei pra minha mãe e ela jura que eu sou... normal...

Quando estacionei na garagem de casa, minha filha caçula apontou na porta e perguntou:

- Lembrou de comprar a acetona que te pedi?

- LEMBREI!!! – gritei eufórica.

- Da acetona?

- Não, lembrei DELA!

- Dela, quem?

- Da minha manicure.

Em seguida peguei minha agendinha e fui direto para o telefone:

- É do consultório do Dr. Daniel? Eu quero marcar uma consulta. Urgente!

- A senhora ligou errado.

23 comentários:

  1. Aplausos. Excelente. Se fosse comigo tinha pirado, detesto conversar com alguém e não lembrar o nome.
    Bjux

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  2. Sueli, já te sigo ha algum tempo,gosto de ler o que escreves,e estou sempre por aqui.Quanto ao teu post de hoje não tenho conhecimento de causa, mas de vez em quando tambem tenho uns apagõesinhos mas nada que meus 51 anos não justifiquem, mas dá uma aflição...
    Bem mudando de assunto, vim aqui pra te dizer que tem um selinho lá no meu blog pra você.Pode passar lá e pegar. Espero que goste.

    Paz e bem pra ti!

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  3. M.Sueli, muito bom! o seu texto, não o apagão,rsrs.
    Eu tenho dito que o Alzheimer tem se tornado um fantasma na vida de todo mundo, um esquecimento basta para acharmos que estamos em vias de degeneração cerebral. Li algo interessante, que as pessoas que principiam esse processo não se dão conta das suas falhas de memória, os que estão próximos (familiares e amigos) é que vão percebendo essa situação. Sendo assim, fique tranquila e, uma perguntinha, você muda muito de manicure? não? ai ai ai, rsrs.

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  4. Sueli....isso está mesmo mau....Conseguiu
    marcar a tal consulta???..'Coitada' da
    Sueli.......
    O que eu me ri....mas não liga não....sabe que.....Agora esqueci o que is dizer...desculpa fica para a próxima...

    Beijo

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  5. kkkkkk, Su!!! Não sei não, mas desconfio que esta vida de blogueira, misturada com tintas e solventes pesados está nos deixando meio piradas... Tenho umas coisas iguais a esta que você narra... e já fico desconfiada do Alzheimer !

    Amiga, acho que temos de fechar nossos computadores, não dá mais pra ler seus e-mails! Tenho uns ataques, começo a rir de você, das suas frases, tão loucas talvez quanto as minhas... E aqui em casa pensam que estou meio desarticulada...

    Esta sua mistura de alho com horário; ovos, galinha e psiquiatra...Nossa, que coisa mais triste, também estou começando a ter medo... Imagino sua faxineira com unhas lindas depois de você lhe tirar o couro.

    Su, você está cada dia melhor: você e suas crônicas! Mas você tem este espírito, por isso que seus textos fluem com facilidade.

    Essa figura de postar só a moldura... rsrs.

    Beijos pra você.
    Tais luso

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  6. Boa tarde, querida amiga.

    Sobre o aspartame eu já ouvi falar demais, mas nunca, no Fantástico.
    Prefiro usar outros.

    Do jeito que você leva a vida, saúde boa nunca lhe faltará.

    Esse pequeno esquecimento, certamente vem da sua agenda repleta de compromissos.

    O seu humor é cativante. Amei...


    Um grande abraço.

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  7. Suuuu! Você é impossível!! rsrs! Lia dando risadas, mulher!! Vixe maria, "horas" de conversa e você sem a mais pálida ideia de quem era! E a acetona? Trouxe tudo a tona!! Só você! Um beijo enorme, sempre!! Deia

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  8. hahahahahaha!!! Esquenta não flôr, acontece com quase todos viu... Olha, vc é extremamente NORMAL...hahahaha

    Então sobre o texto que vc comentou no meu blog: "O valioso tempo dos maduros", fui pesquisar mais, veja o que achei:

    Observação: O publicado está circulando pela internet com autorias atribuídas a Rubem Alves, “Autor desconhecido” e até Mário de Andrade, No entanto, pesquisei e encontrei uma advertência no site de Ricardo Gondim. Segundo ele, o texto, cujo título é "O Tempo que Foge", não é do Rubem Alves. Está em seu livro, intitulado "Creio, mas Tenho Dúvidas", publicado pela Editora Ultimato, com registro ISBN, página 107. Como não tenho como constatar, deixo a advertência...

    Vou ver quem é esse tal Ricardo Gondim... rsrsrsrs

    bjos,

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  9. Oi Sueli, voltei... fiz a pesquisa e já alterei meu post, "O tem que foge" é de Ricardo Gondim... passe por lá e veja as explicações que encontrei... bjos, obrigada pela dica... ;)

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  10. Sueli, simplesmente hilário. Eu também fico literalmente perturbado quando me acontece de não reconhecer uma pessoa se ela me reconhecer, falar, lembrar de coisas que eu não me lembro. Atrapalha tudo o mais que eu tiver que fazaer enquanto eu não conseguir uma pista. Mas aí a vergonha já está instalada. hahaha! Abração. paz e bem.

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  11. Oi qurida agadeço o tua visita e o teu comentário gentil . é querida, devido a incidencia do mal de auzaimer, está assustando a todos nós, não pdemos mais esquecer nada que ja ficamos assustados e as vezes e falta de atnção mesmo o nosso cérebro só armazena o que intereça segundo os psícologos, vamos ter menos medo e viver. um abraço carinhoso Celina.

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  12. Olá, Sueli!
    Entrei para conhecer seu blog, bolg que me foi recomendado por uma minha seguidora, e gostei. Gostaria de vê-la pelos meus dois blogs, ambos de cultura ou de crítica: "Ideias-Novas", sobre Economia sociológica e "Em nome da Ciência", sobre religiões, onde, obviamente, a Bíblia e tudo o que a Igreja inventou para impô-la ao mundo é analisado à luz da Ciência e do Conhecimento. Claro que o Natal nunca existiu!...
    Acessos: http://ummundolideradopormulheres.blogspot.com
    http://ohomemperdeuosseusmitos.blogspot.com
    Francisco

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  13. Caro Francisco!

    Obrigada pela visita e pelo convite, e já de antemão peço desculpas por recusar.

    Vou explicar e serei franca.

    Entrei em seu blog e vi que foi minha amiga Bia Franco quem me indicou. Vi também que ela forneceu alguns links sobre algumas postagens que fiz. Pelo seu comentário percebo que você não as leu. Se tivesse lido, saberia que acredito na bíblia como a palavra inspirada de Deus.

    Não acredito na vasta maioria das religiões e seus dogmas que passam longe das verdades bíblicas.

    Não tenho uma fé cega, meus raciocínios são baseados à luz de um entendimento que é fruto de anos de estudos e pesquisas.

    Eventualmente publico postagens com temas teológicos na intenção de compartilhar, e não debater.

    Sou muito criteriosa quanto a esse assunto e tenho por critério não comentar postagens cujo conteúdo eu não concordo. Entre um comentário contraditório e um mentiroso para agradar, escolho abster-me.

    Sou pessoa convicta daquilo que creio e nenhum debate, por mais bem intencionado que seja, mudará minhas convicções. Será pura perda de tempo.

    Desculpe-me pelo excesso de franqueza.

    Um grande abraço.

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  14. Gente! Há quanto tempo nao passava por aqui! Essa correria já havia me feito esquecer como suas crônicas são óótimas e deliciosas!!!
    Um beijão querida!

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  15. hahahahahaha

    Sueli, voce é impagável...!

    que texto maravilhoso. me prendeu do começo ao fim. voce é uma crônista de primeira categoria !

    um grande beijo!

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  16. Olha, eu sou novo é vivo esquecendo o nome das pessoas, fato...

    Fique com M. Sueli Gallacci.
    Um abraço.

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  17. ola Sueli ,,, passo para deixar aqui um fort abraço e um beijão,,, e te dizer que pessoas como você não perdem a memoria , pois ela esta guardada em cada um proximo de você

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  18. kkkkk , olha eu tenho 22 e as vezes cometo essas gafes , rsrrsrs fico até pensando quando eu ficar velhinha acho que vou tem que viver com um bloco de anotações

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  19. kkkkkkkkkkkkkkkk Que delícia de texto! Véspera de feriado, é bem capaz de eu amanhecer aqui lendo suas histórias e rindo muito com elas!

    Isso do apagão acontece até nas melhores famílias, não se preocupe, amiga! rsrsrs Já aconteceu comigo, de forma muito semelhante! Aquilo de ficar enrolando para nunca mencionar o nome da pessoa... esperar desesperadamente por uma pista, e nada! Sair de cena de fininho, pela tangente como você fez, mas depois passar o dia investigando a pessoa desconhecida com ares de muito amiga! É, já passei por tudo isso... o caso mais recente, por sinal, foi no restaurante semana passada e até agora não lembrei de quem se trata! Isso quer dizer que, por favor, quando encontrar o número do Dr. Daniel, anota num email para mim! Mas ANOTA porque se você apenas falar, eu vou esquecer... rsrsrsrs

    AMEI! Um montão de beijos.

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  20. Sueli, magistral! Uma das melhores cronicas que ja li! Tem certeza de que pintura eh a sua opcao?

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    1. Obrigada João! Aceito o elogio, embora conheça bem sua bondade rsrs. Mal posso acreditar que andou lendo as bobagens que conto aqui rsrs. Parece coisa de ficção, mas são reais, eu atraio confusão, já te contei isso, né... rsrs

      Abraços!

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Sejam bem vindos! Sintam-se a vontade. Comentem, digam o que pensam. Podem rodar a baiana, só não cutuquem a onça com vara curta, ok?... rs